segunda-feira, junho 16, 2008

Sobre os jardins da Covilhã

Estudo prévio para Jardim Botânico no Parque Alexandre Aibéo - Imagem digitalizada a partir do Boletim da Câmara Municipal da Covilhã, n.º 16 - Abril de 2008

1º) O projecto para a reconversão (evito, propositadamente, utilizar o termo "requalificação") do Parque Alexandre Aibéo, na Covilhã, parece avançar. Como aqui escrevi em Outubro de 2006, o projecto de autoria do arquitecto Luís Cabral, autor do Jardim do Lago, pretende criar um Jardim Botânico com espécies autóctones da Serra da Estrela.

Elogio o avanço desta obra, na certeza que a mesma respeitará o património arbóreo aí existente, sobretudo pelo importante papel educativo que a mesma poderá desempenhar, ajudando os covilhanenses a reconciliar-se com a Serra da Estrela. Só se ama o que se conhece...

Jardim do Lago, Covilhã


2º) Por outro lado, avançam as obras do Parque da Goldra, projecto integrado no Programa Polis. Este parque, projectado por uma equipa liderada pelo arquitecto José Oliveira, irá ocupar uma área de 5 hectares ao longo da ribeira da Goldra, o que fará dele a maior zona verde da cidade.

Parque da Goldra, Covilhã

Parque da Goldra, Covilhã (Nota: no centro da imagem, por detrás dos 5 mamarrachos de cor creme, é visível uma das maiores pseudotsugas da Covilhã)

As minhas palavras, no presente, só podem ser de elogio para estas obras. No entanto, preocupa-me o futuro destes jardins, pegando no exemplo do Jardim do Lago que denunciei neste texto.

Recupero as palavras que o Paulo Araújo escreveu há tempos aqui na "sombra verde": "Há a inauguração com sorrisos, presença de ministros, presidentes de câmara, empresas patrocinadoras e reportagens na televisão e nos jornais. Mas há depois o dia seguinte, que já não beneficia da mesma publicidade e de que só tomam consciência os habitantes locais mais atentos e menos desmemoriados. E o dia seguinte é o resultado do mau planeamento (tantas vezes com assinatura famosa) e da má gestão (em Portugal, é triste reconhecê-lo, quase não há jardineiros, mas tão só empresas de manutenção de espaços verdes estereotipados e sem diversidade)".

Dito por outras palavras, terá a Câmara da Covilhã, depois dos milhares de euros dos contribuintes investidos nestas obras, capacidade para fazer a sua correcta manutenção?

Peguemos num exemplo concreto: há cerca de dois anos, foi aberto concurso para a poda de centenas de árvores na cidade da Covilhã. O "preço" proposto foi considerado o factor determinante na escolha da empresa para realizar essa tarefa.
O resultado foi que a empresa vencedora foi uma empresa local sem qualquer especialização na poda de árvores ornamentais. A consequência prática desta decisão tem sido a mutilação de centenas de árvores, como por diversas ocasiões aqui denunciei. O que significa que o dinheiro "poupado" na referida decisão, terá que ser gasto daqui a uns anos para substituir muitas destas árvores.


Com este exemplo não terão os covilhanenses motivos de sobra para temer pela gestão futura destes novos jardins da cidade?


3º) No entanto, e apesar de toda esta situação, a acreditar num inquérito online do "Jornal do Fundão", citado pelo Boletim da Câmara Municipal da Covilhã, n.º 16 - Abril de 2008, a Covilhã foi considerada a cidade da Beira Interior com melhor oferta de espaços verdes.

Levando em linha de conta, que o problema das "podas camarárias" é, em maior ou menor grau, comum à esmagadora maioria dos municípios portugueses, e mesmo tendo em conta o pouco rigor dos "inquéritos online", não deixa de ser uma notícia surpreendente.

O que significa que, talvez mais importante do que ter espaços verdes bem geridos, seja criar junto da opinião pública, essa mesma ilusão...

5 comentários:

Anónimo disse...

Parece-lhe que estes "jardins" vêm corroborar alguma estratégia de desenvolvimento urbano coerente?

Pedro Nuno Teixeira Santos disse...

É uma pergunta à qual respondo com gosto, desde que fique sublinhado o facto de não ser um especialista em planeamento urbano.

Resumindo: independemente de outros factores, nomeadamente a forma como foi planeado/executado o Programa Polis, considero que estas medidas são "remendos" que não resolvem o problema de fundo das urbes portuguesas.
E esse problema é a dependência económica das autarquias em relação ao licenciamento de novas construções. Isso provoca o abandono dos centros históricos para periferias cada vez mais afastadas. Em Portugal não se recuperam edifícios antigos, apenas se constrói (ainda que o mercado imobiliário esteja "hiper-saturado" de oferta e escasseie a procura).

Veja-se que esse abandono não é exclusivo do centro histórico. Peguemos no exemplo da Covilhã: também zonas como o Rodrigo ou a Calçada Alta deixaram de ter o poder de atractividade que tinham há 30/20 anos; entretanto, o "centro" deslocou-se para a zona das escolas e da central de camionagem. Mas, entretanto, criam-se "centros" ainda mais periféricos (Teixoso, Tortosendo,...), ou seja, as pessoas vivem cada vez mais longe, perdendo cada vez mais tempo e gastando mais combustível nas suas deslocações para os empregos.
A escalas diferentes, é algo que se passa em todas as cidades portuguesas.

Curiosamente, o comentário da monarca da Noruega, aquando da recente passagem pelo Porto, foi que o nosso país é muito bonito, mas com muitos prédios antigos por recuperar. É que na Noruega e apesar do muito dinheiro do petróleo, não existe uma política que invista em novas construções em detrimento da re-utilização das mesmas.

Voltando à Covilhã e a estes jardins...Na minha opinião, o Parque da Goldra, por exemplo, é uma estrutura que permite a recuperação de uma zona degradada da cidade e que as pessoas se "reconciliem" e usufruam daquele vale. Isto, claro está, apesar das dúvidas que tenho quanto à sua gestão futura.

No entanto, o verdadeiro problema é que a mesma "dependência" que permitiu que o caos urbano se instalasse a partir do anos 70, continua bem presente nas cidades portuguesas; ou seja, hoje gastam-se milhões em "polis" para se recuperar o que se fez de errado nos anos 70/80 e daqui a uns anos estaremos com a necessidade de novos "polis" para recuperar o que hoje destruímos!

"Remendamos" num lado e cometemos exactamente os mesmos erros de planeamento no sítio ao lado.

Por isso, apesar de "aplaudir" algumas destas intervenções, concordo que continua a não existir, em termos globais, uma estratégia coerente para a Covilhã e demais cidades

Anónimo disse...

Boa noite,Pedro
Acha mesmo que a casa a que se refere é a Roque Cabral e é um mamarracho pimba??

Pedro Nuno Teixeira Santos disse...

Caro anónimo:

Eu utilizo o termo "mamarracho" para designar os 5 prédios de cor creme que se situam na Calçada Alta, visíveis ao centro na imagem que publico. O termo "mamarracho" poderá ser discutível, uma vez que estes prédios têm uma estética semelhante a centenas e centenas de outros prédios por esse país fora. (E hoje em dia não se constroem coisas muito melhores, pelo menos a julgar por alguns edifícios nas imediações do mais famosos centro comercial desta cidade).

No entanto, na legenda dessa fotografia, quis chamar a atenção não propriamente para esses ditos prédios, mas sim para a magnífica pseudtsuga (árvore de forma cónica com semelhanças aos cedros) que se vê por detrás dos referidos prédios, nos jardins da casa que, tanto quanto julgo saber, pertence actualmente à família do Dr. Amândio Nunes (provavelmente é aqula que identifica como Roque Cabral?!).

Essa casa não tem para mim nada de pimba, agradando-me não apenas a sua arquitectura, mas a pseudotsuga e as palmeiras que tem nos jardins.

Onbrigado pela questão.

Daniel dos Santos disse...

Infelizmente os jardins na urbe são utilizados para tapar vazios urbanos e não têm em conta nem corredores naturais (linhas de água, fauna e flora) nem têm em conta as necessidades ambientais, como é o caso da purificação do ar. Parece que os arquitectos da câmara já se esqueceram dos conceitos de cidade-jardim, que surgiram para acabar com os problemas das cidades industriais do século XX. Um jardim ou um parque não é só pavimentar a calçada, por umas flores e pendurar uns baloiços… Isto entristece-me porque vejo que as pessoas não querem fazer o melhor para os sítios e fazem obras para encher o olho e dizer que está feita (propaganda politica).